A felicidade é para viver. Não é certo sentir culpa por ter felicidade, a felicidade é para ser tomada nas mãos, é para ver. E - a despeito dos meus fantasmas - vejo cabreira que aquela nuvem negra não existe, não como eu, nem como a felicidade, que é de carne e osso, a dança mais escandalosa, impune, feita sob os olhos indecifráveis de Deus.
Cristina Cezar
Não sei o que vai acontecer, mas, neste instante, escrevo a minha vida - somos todos escritores.
quarta-feira, 22 de junho de 2011
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
O MEIO
Tinha aquele homem parado junto à escada do hotel fechado,e um dentro no carro, do outro lado da esquina. Não sei por que associei os dois em meio à multidão, dois rostos sem mensagens ou ameaças, sem traços comuns entre eles, ou qualquer impressão dissonante do que poderia ver no resto da rua. E de tanto olhar para um e para outro, de novo passei batida pela floricultura. Dez passos é muita coisa para quem está atrasado. A viatura surgiu como um raio vindo da avenida. O homem do carro abriu a porta e saiu atirando em quem passava, até morrer em público. Eu estava no meio do caminho.
_ Tem outro ali! Ali!
A velha gritava de dentro da igreja apontando para o rapaz escondido atrás do vaso com a orquídea ressecada. Dez passos é muito pouco. O policial correu com a arma em riste.
_ Você! Sai daí!
Mas o garoto não saiu.
_ Vai, moleque!
Sou doida por orquídeas. Não foram feitas para torrar ao sol numa manhã sangrenta. E o sol estava cruel, iluminando tudo por igual e roubando as cores, deixando as imagens sem nuances, como um holofote, uma lanterna do inferno. Tentava ver o rosto escondido do rapaz, como fazia o policial confuso, sem saber o que esperar do que se punha por trás das pétalas delicadas, condenadas. Olhei de novo para o homem da escada, e desta vez era ele quem me olhava, e então pude reconhecê-lo. Ele andava pelas ruas do meu bairro quando eu era uma menina, vendendo raízes e ervas de cura. Eu não conseguia compreender.
_ Põe a arma no chão!
O garoto olhou para o policial, depois para o homem na escada do hotel, procurando um sinal, eu pude sentir, mesmo sem ver. Por um rabicho de segundo, me dei conta do que nos unia, todos nós ali, no meio do caminho, entre flores e estranhos.
_ Tem outro ali! Ali!
A velha gritava de dentro da igreja apontando para o rapaz escondido atrás do vaso com a orquídea ressecada. Dez passos é muito pouco. O policial correu com a arma em riste.
_ Você! Sai daí!
Mas o garoto não saiu.
_ Vai, moleque!
Sou doida por orquídeas. Não foram feitas para torrar ao sol numa manhã sangrenta. E o sol estava cruel, iluminando tudo por igual e roubando as cores, deixando as imagens sem nuances, como um holofote, uma lanterna do inferno. Tentava ver o rosto escondido do rapaz, como fazia o policial confuso, sem saber o que esperar do que se punha por trás das pétalas delicadas, condenadas. Olhei de novo para o homem da escada, e desta vez era ele quem me olhava, e então pude reconhecê-lo. Ele andava pelas ruas do meu bairro quando eu era uma menina, vendendo raízes e ervas de cura. Eu não conseguia compreender.
_ Põe a arma no chão!
O garoto olhou para o policial, depois para o homem na escada do hotel, procurando um sinal, eu pude sentir, mesmo sem ver. Por um rabicho de segundo, me dei conta do que nos unia, todos nós ali, no meio do caminho, entre flores e estranhos.
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Imagem: obra de Banksy
quarta-feira, 8 de setembro de 2010
ESPERANÇA
Uma esperança pousou em mim. Depois de sacudida, espantada como uma abelha, colou-se na superfície branca e fria, nem perto nem longe de mim. Fiquei o resto da noite trançando com ela uma linha entre a sala e a janela de trás, zanzando atrás dela, namorando a esperança vívida, imóvel como um recado. A esperança alçou seu vôo sem repúdio de mim. Deixou o seu fluido na casa, e no outro dia, ainda cedo, dei com um filhote de esperança pousado no meu nariz.
domingo, 22 de agosto de 2010
O CÃO
Eu olhava para o cão branco, atropelado pelo taxista indiferente, morto no meio da rua, e o cão malhado fazia o mesmo na outra margem daquele rio de sangue, impotente junto ao meio-fio, ansioso por aproximar-se do amigo, sem que a rua perigosa lhe desse uma trégua. Juro que até aquele momento achei que só o homem, em sua natureza atípica, fosse capaz de dar a si mesmo, e ao mesmo tempo, dois comandos tão antagônicos como agir e esperar. Mas o cachorro do outro lado da rua se via no mesmo conflito, e eu me vi nele, e foi um desses momentos em que se tem a noção clara de que somos todos parte de uma coisa só. E me senti mais distante do meu semelhante genético - aquele dentro do táxi, a alguns metros, junto ao semáforo vermelho, com as portas e as janelas fechadas - do que daquele cão, vira-lata confuso como eu, com tração nas quatro patas, procurando um lugar neste mundo. Perdi no resto do caminho o sorriso que guardei para os colegas, e imaginei uma ruga a mais para o rosto no quadro escondido atrás da minha porta.
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Imagem:"The Dog",
Picasso
quinta-feira, 5 de agosto de 2010
FELIZ ANIVERSÁRIO
quinta-feira, 29 de julho de 2010
Mantra
terça-feira, 20 de julho de 2010
Tarantino E Sua Cartola
À PROVA DE MORTE é um filme adorável. Fui assistir à mais nova fábula de Quentin Tarantino no último fim de semana. Para mim, esse cara é uma espécie de mágico, desses artistas que gostam de fazer a sua obra parecer mais fácil e simples do que realmente é, mas que esconde, por trás da graça sangrenta e quase infantil, o talento de hipnotizar os espectadores e envolvê-los em sua teia, sua fantasia, suas regras. Depois de assistir a uma fita de Tarantino, nunca escapo a duas impressões: uma é a imagem do garoto não muito popular que passou boa parte da adolescência de frente para a TV sorvendo os filmes e seriados da década de setenta. A outra é o meu coração mais vibrante, e a vontade instantânea de ver novamente o mesmo filme. Deve ser mágica mesmo.
sexta-feira, 16 de julho de 2010
Olho Cego No Horizonte
Decidi usar pouco mais que o instinto para contar a minha primeira estória. Optei pela narrativa no presente, e, após um tanto de folhas escritas, percebi a trama seguindo sem a figura do narrador, com o ponto de vista sobre o contexto diluído entre os personagens, bem como a ausência de um protagonista.
Prefácio
Em um país da América do Sul às vésperas de um golpe militar, acontece na Capital a edição de uma importante mostra de Teatro. Personalidade aguardada no evento, Julia será o centro de uma operação de sequestro arquitetada por Lucas,o Hacker, filho do General Batalha. Contando somente com um antigo cliente para agir, nem Lucas poderia imaginar que as consequências do seu plano se tornariam tão perigosamente incontroláveis. O envolvimento imposto aos três personagens desenha um breve e inusitado cotidiano, que os leva a mergulhar em sentimentos e facetas até então completamente desconhecidos.
Olho Cego No Horizonte foi lançado em 2007 pela Editora Litteris/Kroart na XIII Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro e na Livraria da Vila, em São Paulo.
O livro pode ser adquirido na Livraria da Vila( São Paulo);
Tapete Mágico(Vitória); Prazer da Prosa(Vitória); FIEMG(Ouro Preto) e pelos sites da Livraria Cultura; Editora Litteris e Estante Virtual.
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